quarta-feira, 21 de março de 2007

Quinta á Noite

Era quarta-feira á tarde e como já era habitual, as três amigas estavam sentadas nos sofás da sala de convívio, há já algumas horas. Nesse dia e ao contrário do que costumava acontecer, trabalhava-se. A festa da próxima semana tinha de ser planeada, e havia alguns aspectos da decoração que estavam por acordar.
A Ana, como já era habitual, estava sentada, num cantinho do sofá que lhe permitia ver a televisão, mas também todas as entradas da sala, a Maria e a Raquel, sentaram-se ao acaso naqueles confortáveis sofás. O trabalho decorria a um ritmo bastante calmo, e enquanto a Ana fazia alguns esboços da decoração para o bar, as amigas recortavam letras em jornais e revistas. A intervalos bastante irregulares, a atenção das três, lá se desprendia do trabalho, para admirar um ou outro rapaz que entrava na sala.
Já passava das quatro e meia, quando a Ana deu por concluído o esboço da decoração, e como não eram elas os únicos elementos da comissão de finalistas, era necessário, mostrar o esboço á presidente.
A Andreia, não era bem a presidente, aliás, nem sequer houve uma eleição, mas era ela que “comandava as tropas”, uma vez que tinha adquirido bastante experiência desde que decidira ser membro da associação de estudantes.
- Quem é que vai á associação mostrar isto? – Perguntava a Ana.
- Vais tu… – Apressou-se a Maria a dizer
- Eu? – Ainda tentou Ana, mas não teve outro remédio se não ir ela mostrar o desenho.
Assim que entrou, encontrou a Andreia, sentada a uma secretária a trabalhar, também lá estava um rapaz que a Ana só conhecia de vista e de ouvir a Maria falar, é que ele já tinha dormido no quarto dela, quando a Matilde, uma amiga das três, que estava agora a estudar em Setúbal, o tinha levado para casa dela. A Ana não sabia muito bem o que tinha acontecido entre a Matilde e o Zé Diogo, mas tinha quase a certeza que no mínimo tinham rolado uns beijinhos.
- Olá Andreia, acabei agora mesmo o plano da decoração, queres dar uma olhadela e ver se gostas. – A Ana entregou o desenho á amiga, e ficou de pé, não queria demorar muito, nem atrapalhar a colega que certamente tinham muito trabalho entre mãos.
- Podes sentar-te não pagas mais por isso. – Disse uma voz, que Ana não reconheceu de imediato, aliás nem tinha percebido muito bem de onde viera, só no fim de alguns segundos percebeu que tinha sido o Zé Diogo, e achando bastante antipática a intervenção dele apressou-se a dizer, baixinho, mas suficientemente alto para que ele ouvisse – Que simpático!
- Não gostas, põe na borda do prato. – Disse ele
- Olha Andreia, desculpa lá mas eu vou embora, não tenho que aturar estas bocas foleiras. – E já á saída e de costas para ambos disse – Parvalhão!
Quando voltou a sentar-se nos sofás a sua expressão facial estava completamente alterada, e as amigas, notando de imediato, que algo não tinha corrido bem, apressaram-se a perguntar o que se tinha passado, e depois de tomarem conhecimentos dos factos ficaram perplexas, afinal sempre acharam o Zé Diogo um tipo bastante simpático.
O tema depressa foi esquecido, e já tinham voltado ao trabalho, quando a Andreia saiu á porta da AE e chamou a Ana, embora um pouco contrariada ela lá se levantou e entrou na pequena sala, atafulhada de secretárias e computadores.
- Olha, Ana, chamei-te aqui porque o Zé Diogo, quer pedir-te desculpas.
- Ai quer? Então mas quer porque percebeu que foi estúpido para mim, ou porque foste tu quem o mandou pedir desculpas? Alias, ele nem sequer se devia importar com isso, ele não me conhece, eu não o conheceu, por isso o que é que importa que eu fique a achar que ele é um parvalhão? – E depois de dizer isto, a Ana olhou para ele. Tinha a cabeça baixa, mas via-se perfeitamente lágrimas a cair. Quando a Ana percebeu que ele estava a chorar, pediu baixinho á Andreia que os deixasse sozinhos e dirigiu-se para ele. Já ao pé do Zé Diogo, envolveu-o num abraço muito forte., e ficaram assim, abraçados durante largos minutos. Ele ainda tentou falar, para pedir desculpa, provavelmente, mas a Ana não deixou, e continuaram abraçados por mais um bocadinho. A cabeça da Ana estava um turbilhão, por um lado perguntava-se o que se teria passado, e por outro sentia-se culpada por ter falado tão mal com o Zé Diogo, seria culpa dela, o facto de ele estar assim, certamente não seria por isso, afinal é preciso mais para um rapaz chorar daquela maneira, devia ter acontecido algo muito grave, mas não podia deixar de se sentir culpada, afinal tinha sido muito estúpida, não valia a pena ter falado assim para ele.
- Tas melhor? – Perguntou a Ana quando percebeu que ele estava mais calmo.
- Sim… – E ouvindo isto a Ana levantou-se do colo dele para ir embora, mas depressa sentiu uma mão a puxar o seu braço
- Não me deixes aqui sozinho. – E ouvindo estas palavras, a Ana deixou-se estar. Tinham as mãos dadas, e olhavam ambos nos olhos um do outro, nenhum deles dizia nada, mas também não era preciso. O silêncio e o olhar de ambos dizia tudo, mas foi quando a Ana olhou para cima da secretária que percebeu o que se tinha passado.
A carta com letra de rapariga e a fotografia rasgada disseram tudo, a namorada tinha acabado tudo com ele, a Ana não sabia o motivo, mas também pouco importava porque certamente ele gostava muito dela, e ela não soube perceber isso. Tentou articular algumas palavras de consolo, mas não conseguiu, o facto de ver um rapaz a chorar por causa de uma rapariga intimidava a Ana, ela que sempre pensou que os rapazes eram incapazes disso. Mas pelos vistos, o Zé Diogo não era igual aos outros, isso ou gostava mesmo muitíssimo da namorada.
Nesse momento a Andreia entrou na sala, e ainda bem porque a Ana estava a sentir-se verdadeiramente desconfortável com a situação, e então num gesto de carinho levantou-se da cadeira que ocupava, e deu um beijo na testa do Zé Diogo, e não dizendo nada, saiu da AE.
Quando se voltou a sentar nos sofás as amigas olhavam para ela muito serias e nos olhos delas conseguia perceber-se um ar de dúvida muito grande. E então, para satisfazer alguma da curiosidade delas a Ana limitou-se a dizer: - A namorada acabou com ele.

Ao outro dia á noite, a Praça da Republica estava cheia, parecia que todos os alunos da ESE e da ESTG tinham saído á rua. E no meio daquele amarfanhado de pessoas, o Zé Diogo lá encontrou a Ana. Ele sentia que lhe devia uma explicação, afinal ele tinha sido muito estúpido para ela, e mesmo assim, quando ele precisou de apoio e carinho ela não hesitou em ficar ali com ele, embora para além de não o conhecer, ela tivesse muito má impressão dele.
Ela estava com as amigas, ele não sabia se devia interromper, a verdade é que lhe faltava a coragem, queria agradecer-lhe e pedir desculpa, mas o orgulho era forte e não deixava, afinal nem sequer se conheciam, que mal podia fazer? Não, tinham que ir falar com ela.
Deu um passo em frente, mas a coragem faltou uma vez mais. O que fazer? Era a pergunta que passava pela sua cabeça nesse momento. Queria acabar com aquela tortura, o melhor era ir embora. Mas por outro lado ela merecia uma palavra de apreço. Deu mais um passo, mais alguns metros e estaria mesmo ao pé dela, tentou obrigar-se a andar mais um pouco, mas era impossível, estava, agora, ali parado a olha para ela, não podia ser, tinha que ir lá. Então dirigiu-se ao local onde ela se encontrava, e tocou-lhe no ombro, ela voltou-se, e quando percebeu quem a chamava ficou muito surpresa:
- Tu? Precisas de alguma coisa? – Depressa se arrependeu de ter dito aquilo porque a reacção, do Zé Diogo não foi a melhor.
- Não é nada de especial, só queria pedir-te desculpa, mas se estás ocupada fica para depois. – E dito isto, Zé Diogo, virou as costas e foi embora
- Não espera… – ele parou – podemos falar agora, não há problema. – Ela aproximou-se dele, e ele virou-se.
- Então se não te importares vamos até minha casa para podermos falar mais á vontade. -depois da reacção dela percebeu que se calhar não devia ter pedido aquilo.
- Até á tua casa? Não podemos falar aqui? Eu sei que há aqui muita gente, mas podemos procurar um sítio mais calmo. É que é, tipo, esquisito, ir a casa de uma pessoa que nem conheço. – Riu-se. O Zé Diogo achou bastante piada aquela timidez toda, mas não se riu.
- Eu sou o Zé Diogo, muito prazer! – Apresentou-se enquanto lhe dava um aperto de mão e depois um beijinho, ela rui-se mais uma vez. – Agora já não somos desconhecidos.
Ela achou bastante piada á intervenção dele e lá acabou por ir.

A casa dele não era longe, e em cinco minutos, estavam os dois sentados, em cadeiras no quarto dele. A Ana não estava de facto nada á vontade com aquela situação, e percebendo isso, o Zé Diogo, tentou fazer com que ela descontraísse.
- Queria mesmo agradecer o que fizeste por mim, e pedir desculpa por ter falado tão mal contigo. – Começou ele – Eu estava um bocado chateado, porque a minha namorada tinha acabado comigo, mas de qualquer maneira, não tinha o direito de descarregar em cima de ti. E embora o tenha feito, quando percebeste que eu estava mal, não hesitas-te em tentar animar-me, e fiquei a admirar muito isso em ti. O facto de saberes separar as coisas, e embora não gostes de uma pessoa isso não te impede de a ajudar quando ela precisa. E pronto basicamente era isso.
- Então posso ir embora? – Perguntou logo ela.
- Tão? Mas porque?
- Não leves a mal não é nada contra ti. Até gostei bastante que tivesses vindo falar comigo, e que me tivesses pedido desculpa. Aliás nem esperava outra coisa de ti. Mas não sei se já reparas-te que estamos em tua casa e tal… e eu não estou muito á vontade, pronto, é isso. Eh pá, não tenho culpa. Não te rias, a sério. Eu sou envergonhada.
- Não estejas, não vale a pena. Está tudo bem. Só cá estamos nos os dois… – E fez-lhe uma festinha na cara.
- Olha em relação ao facto de tu e a tua namorada terem acabado, tenho uma coisa para te dizer. Sabes, sempre achei super estúpido ver um homem a chorar. Não sei bem porque, mas os homens não choram, estás a ver? E ver-te a ti a chorar, ainda por cima pelo motivo que foi, foi um bocado esquisitinho. Sabes, acho que não te devias preocupar tanto com isso. Se calhar gostavas muito dela, mas…
- Ana, não fales do que não sabes.
E pegando nas mãos dele – Desculpa, não te queria ofender. Só queria dizer, que tenho a certeza que mais tarde ou mais cedo vais acabar por esquece-la e encontrar alguém que goste muito de ti. – Os olhos dele encheram-se de lágrimas. – Não chores, por favor. Ela não merece as tuas lágrimas.
- Mas não percebes que eu a amo? – E deixou cair uma lágrima.
- Não realmente, não percebo. Aliás eu nem sequer acredito no amor. Não nesse amor, um amor que não é recíproco. Tu estás é chateado por ela te ter deixado. Porque se fosse ao contrário nem sequer te importavas.
- Estas a ser muito estúpida. Tu não sabe nada da minha vida…
E abraçando-o disse: -Tão conta-me.
- Ela deixou-me para ficar com o meu melhor amigo. Percebes? Para além da namorada perdi o amigo. E percebi que ela nunca tinha gostado de mim. Ela usou-me só para chegar até ele. Percebes?
- Sim, eu percebo. Chiuuuu. – E dito isto beijou-lhe a testa, e quando os seus olhares voltaram a cruzar-se, os seus lábios aproximaram-se, e envolveram-se num beijo.
A intimidade entre eles crescia a olhos vistos, e quando se aperceberam, já estavam demasiado envolvidos para parar. Mas ainda assim, nada aconteceu.
- Desculpa mas eu não posso fazer isto. – Disse a Ana. – Não assim. Isto só está a acontecer porque estas a tentar usar-me para esquecer a tua ex-namorada. E isso para mim não dá. Não costumo ir para a cama com qualquer um. Muito menos se esse qualquer um nem sentir o que está a fazer.
- Sim tens razão desculpa, não quero pressionar-te. Mas acho que não sou qualquer um, aquilo que eu senti quando te beijei foi verdadeiro, e sei que tu sentiste o mesmo, não tentes disfarçar que eu sei que sim.
Era verdade, a Ana tinha sentido algo muito forte quando o beijou, não dava para disfarçar, era demasiado evidente.
- Sim, se calhar senti, mas não sei se quero sentir.
- Nunca mais queres voltar a estar comigo? É isso que queres dizer?
- Sim…Não…Não sei. – Explicava-se Ana. – Oh pá sei lá. Isto é um bocado confuso. Adorei o que se passou, e quero repetir, mas…
- Mas? – Interrogou Zé Diogo. – Há um mas? Eu sou livre e tu também. Além disso não estou a pedir-te para namorares comigo.
- Sim eu sei. Aí, o que é que queres que eu te diga. Isto é esquisito, eu nem sequer sei nada da tua vida. Tipo nos nem nos conhece-mos. E sabes tão bem como eu que o primeiro impacto não foi muito positivo. Tipo tu acabas-te á pouco tempo com a tua namorada e estás de rastos. E eu não sei se quero continuar com isto, porque tenho a certeza que me vou apaixonar, e tu vais mandar-me á mãe.
- Descontrai e aproveita a vida…
E olhando para o relógio, a Ana disse: - Já é muito tarde, tenho que ir para casa, a gente depois resolve isto. – E quando se ia despedir com um beijo na cara, o Zé Diogo deu-lhe um beijo na boca. – Não vais desistir pois não? - Perguntou a Ana.
- Não!
- Então vemo-nos quinta á noite.

Depois de uma atarefada semana, chegou finalmente a noite de quinta-feira, a noite pela qual a Ana e o Zé Diogo tinham esperado, ansiosamente durante sete longos dias. E a essa quinta, outras se seguiram, e a noite acabava sempre em casa do Zé Diogo. As coisas não avançavam além dos beijinhos, mas conheciam-se cada vez melhor, e já não trocavam, aquelas curtas horas por nada. Mas havia um problema, essas noites estavam a acabar, o Zé Diogo era finalista, e no final do ano ia embora para a sua terra, e os dois nunca mais se voltariam a ver.
A penúltima semana de aulas começou, e depressa chegou o dia de quinta-feira, e mais uma vez sentadas na sala de convívio, a Ana, a Maria e a Raquel, estavam desta vez a estudar para as ultimas frequências do ano, quando vêem entrar pela porta a Matilde, já á muito tempo que não se viam, e as saudades já apertavam, e depois de muitos abraços e beijinhos, e de por em dia algumas novidades, a Ana lembrou-se que certamente a Andreia estaria na AE, e também gostaria de ver a Matilde, então, pegou nela e entraram as duas na sala.
De facto a Andreia estava na AE, mas não era a única, o Zé Diogo também, lá estava, e quando viu a Matilde, fez uma cara que a Ana não conseguiu interpretar facilmente, mas parecia-lhe talvez um pouco incomodado. Mas, porque? Será que eles se conheciam? E foi quando se lembrou que eles já tinham dormido juntos em casa da Maria. Será que tinha rolado mais qualquer coisa além dos beijos? Provavelmente sim, depois da cara que ele fez não havia grandes duvidas.
Mas porque é que isto incomodava tanto a Ana, estaria com ciúmes? Não, não podia ser. Ciúmes, ela? Bem se calhar um bocadinho, mas estava decidida a não mostrar de maneira nenhuma o que estava a sentir. Ele não podia perceber de maneira nenhuma o que se estava a passar.
Então, tentou agir com a maior naturalidade que conseguia, quando ele lhe veio dizer ao ouvido que se viam á noite.
Como não viam a Matilde há um ano, decidiram ir jantar todas, e tinha que ser na casa da Maria, para lembrar os velhos tempos.
O jantar correu muito bem, e á meia-noite, depois de uns copinhos, e de estar toda a gente muito animada, decidiram então ir um pouco até á praça.
A Matilde estava muito bêbada e só já dizia disparates, mas todas se riam muito das barbaridades que iam ouvindo. Quando chegaram á praça e como já ia sendo habitual nas últimas semanas, estava cheia de pessoas. Entraram num bar, noutro, noutro ainda, e umas queriam ficar no Lagartos, outras no Impactos e outras na praça. Então acabaram por se dividir, e enquanto a Ana ficou na praça com a Maria e o namorado dela, a Matilde e a Raquel foram até ao Lagartos. As outras foram para o Impactos.
A noite estava muito agradável, e a Ana, a Sara e o Filipe sentaram-se num banco e ficaram a conversar. No fim de um boa meia hora a Matilde e a Raquel vieram juntar-se a eles, mas não estavam com muito boa cara.
- Passou-se alguma coisa? – Perguntou a Ana preocupada.
- Oh não nada. Acho que pus os cornos ao meu namorado. – Disse a Matilde visivelmente muito bêbeda ainda.
- Com quem? – Perguntou a Ana, desta vez á Raquel que estava bem mais sóbria.
- Não sei. Não me apercebi de nada. Ela foi á casa de banho e quando voltou disse-me isto. – Respondeu a Raquel
A conversa acabou por ali, mas havia um mau pressentimento que não saia da cabeça da Ana, só esperava estar errada. Apesar de tudo a noite continuou, e uma depois da outra, as amigas de Ana, iam para casa. Só ela é que ainda esperava pelo Zé Diogo, ele que lhe tinha prometido ir ter com ela no final da noite, parecia não aparecer. No fim só já estavam a Ana e a Matilde, que continuava muito bêbada.
- Matilde, eu se calhar ia indo para casa, queres que te vá levar? Quer dizer, é melhor levar-te porque tu estás, assim, um pouco alegre de mais. Vá vamos lá. – Mas quando acabou de dizer isto, sentiu alguém atrás de si.
- Foi com ele. – Disse a Matilde baixinho do outro lado.
Não podia ser…
- Tu e o Zé Diogo…
- Tem calma, vamos leva-la a casa e depois conversa-mos. – Disse o Zé Diogo.
A Ana não queria acreditar, não podia ser verdade, a Matilde não podia ter traído o namorado com o Zé Diogo. As suas suspeitas eram verdadeiras. No caminho até casa da Matilde ela não consegui pensar noutra coisa, e quando saíram de casa dela ainda continuava a chorar por dentro. Embora não quisesse, tinha que admitir que estava completamente apaixonado pelo Zé Diogo, e tinha que admitir também que aqueles acontecimentos a tinham magoado muito.
No caminho até á casa dele não disse uma palavra, quando ele tentou pegar-lhe na mão ou dar-lhe um beijo ela afastou-se. Mas quando chegaram a casa dele começou a falar:
- Eu sei que nos não temos nenhum relacionamento, oficial nem sério, nem sequer assumi-mos nenhum compromisso. E como tal cada um de nos é livre de fazer aquilo que quiser, com quem quiser. Mas não me peças para agir como se nada fosse. Eu não sou capaz. Eu não queria mas a verdade é que depois de tudo o que passamos juntos eu apaixonei-me por ti, e como tal é natural que fique magoada com este tipo de coisas. Por isso se calhar vamos dizer, adeus, um ao outro uma semana mais cedo.
- Ana, não…
- É melhor ficarmos por aqui. – Mas quando ela disse aquilo, ele pegou na mão dela, virou-a para ele, e beijou-a. Ficaram ali a beijar-se durante o que pareceram horas, ele passou a mão pelo corpo dela, começou a tirar-lhe a blusa, ela tirou-lhe também a T-shirt, os seus corpos pulsavam de desejo, e ali mesmo, na sala de casa dele fizeram amor.
Ainda enrolados no corpo um do outro, ele disse:
- Desculpa, eu não queria beija-la, ela estava muito bêbeda, e eu fui á casa de banho e ela apanhou-me e beijou-me. Desculpa, eu não queria a sério. – Ela não disse nada.
- Não dizes nada?
- Que queres que diga? Que te amo e que desculpo, que desculpo tudo o que fizeste, tudo o que não fizeste, tudo o que vais fazer? Até posso desculpar o beijo que vocês deram, mas não consigo dizer que te amo, não sabendo que na semana que vem vais embora e eu nunca mais te vou ver.
- Mas eu não tenho culpa, tenho mesmo que ir.
- Eu sei e isso ainda me chateia mais, acho que preferia que me mandasses ás couves.
- Mas eu não vou mandar-te as couves, eu amo-te.
- Cala-te. Nem digas isso.
- Eu não me quero calar, quero que saibas aquilo que sinto.
- Para que? Para na semana que vem sofrer mais quando te fores embora?
- Não, para te lembrares sempre de mim, assim, apaixonado por ti. Vamos passar a semana inteira juntos. Diz-me que queres passar a semana inteira comigo, por favor.
- Quero passar a semana inteira contigo. – Disse ela baixinho, e beijaram-se, beijaram-se muito. Quando acordaram estavam ainda nos braços um do outro, e uma nova semana ia começar, a sua última semana juntos.

Durante toda a semana, a Ana e o Zé Diogo foram inseparáveis, onde estava um estava ou outro, mas ambos sabiam que estava a acabar, dentro de alguns dias ia acabar, nunca mais se veriam, e não podiam fazer nada para evitar isso, o pior é que se amavam profundamente, e mesmo assim o destino ia separa-los.
Era novamente quinta á noite, a última noite da Ana e do Zé Diogo juntos, estavam os dois em casa dele, um sentado num lado da cama e o outro no outro. Ao fim de algum tempo de silêncio, o Zé Diogo decidiu aproximar-se.
- É assim que vamos passar o nosso último dia juntos? Ana vá lá, não chores, já sabias que ia ser assim. – Disse ele dando-lhe um beijo na testa.
- Mas e se eu não quiser que isto termine assim.
- Não há nada, que possamos fazer para evitar isto, só aproveitar o nosso último dia juntos. Quero que esta noite seja a melhor noite de sempre. – E quando acabou de dizer isto, o Zé Diogo aproximou-se da Ana e beijou-a, limpou-lhe as lágrimas, e abraçou-a. Ela beijou-o muito docemente, e envolveram-se num último abraço e numa última noite de amor.
Nenhum deles dormiu, limitaram-se a ficar ali, abraçados, como se os seus corpos fossem um só, mas o maldito despertador tocou, e anunciou a hora da despedida. Eles não queriam levantar-se mas o despertador não parava de tocar, era como se o mundo estivesse todo contra eles, agora até os despertadores tinham armado um complo para os separar.
- Temos que nos levantar. –. E ao mesmo tempo que dizia isto, a Ana levantava-se lentamente e vestia-se. Ele pelo contrário ficou ali, deitado, a vê-la vestir-se. Nenhum deles dizia nada, e os seus movimentos tornaram-se mecânicos. E obrigados por um destino que não era o deles, por um destino que não queriam, dirigiram-se á porta, e depois até o carro dele.
As malas já estavam todas arrumadas, não sobrava mais nada para levar, e depois de demorarem o mais possível naquela tarefa tinha chegado a hora que ambos temiam.
- Queria que soubesses… – Começou ele.
- Não digas nada…Vai. – E ele entrou no carro, ela ainda estava estática, no mesmo sítio de onde ele segundos antes tinha saído. Mas tinha que o para, não podia deixá-lo ir embora sem antes lhe dizer uma coisa, não, não podia. Então correu, correu até á porta do carro que acabara de se fechar, abriu-a, puxou cá para fora, abraçou-o.
- Amo-te.
Ele nunca pensara ouvir aquela palavra sair da boca dela, aquilo tinha significado o mundo para ele, e agora, de novo dentro do carro, e olhando-a pelo retrovisor, carregou no acelerador. Nunca ninguém lhe tinha dito aquilo, nunca tinha sentido que alguém o tinha amado como ela o amava. Mas estava destinado, tinha que acabar tudo naquele momento. Talvez acabasse, para daqui a uns anos, voltar a começar. Daqui a uns anos, sim, tinha a certeza, quando fossem ambos mais adultos, iam encontrar-se e poderiam ser felizes. Entretanto ia esperar por ela, tinha que ser, porque só a ilusão de um reencontro lhe dava forças para continuar.

1 observações sobre as parvidades que escrevo!:

Anónimo disse...

Por que nao:)